Filme pipoca também pode ser cult, por que não?


Tanto falatório em torno de A origem me deixou com uma curiosidade danada. Com expectativas altas também, já que o papo era que estávamos diante do novo Matrix. E isso sempre é um perigo. Mas sim, o filme é muito bom, e não, o longa de Christopher Nolan não segue exatamente a mesma linha da ficção científica dos irmãos Wachowski, embora as semelhanças sejam muitas. E vou dizer que é muito animador sair do cinema tentando puxar pela memória e ver se você não deixou escapar nenhum detalhe. Filme hollywoodiano que não menospreza a inteligência do telespectador, coisa rara hoje em dia.

O segredo para não se perder é embarcar no roteiro e deixar as perguntas para depois. Logo de cara, Cobb (Leonardo DiCaprio) faz um resumo: ele é uma espécie de ladrão, que invade o subconsciente alheio para roubar informações preciosas. Quando a coisa começa a dar errado, não demora muito para percebermos que a situação não é bem o que parecia à primeira vista (e estava sendo explicadinha pelo protagonista, lembram?). Ah, as reviravoltas... Delícia.

Difícil contar muito sem estragar as surpresas da história, mas dá pra adiantar que a próxima missão da nossa equipe será ainda mais complexa que a de costume: implantar uma ideia na mente de outra pessoa. Tarefa arriscada, mas aceita. E é a partir daí que vamos vendo a coisa tomar forma. Como nos filmes de grandes roubos tradicionais, chega a hora de formar a equipe com o melhor de cada especialidade: o químico, a arquiteta, o falsificador... Melhor que isso só o elenco que Nolan conseguiu reunir: Joseph Gordon-Levitt, Ellen Page, Tom Hardy, Ken Watanabe, Cillian Murphy, Marion Cotillard e até Michael Cane numa ponta de luxo. A folha de orçamento deve ter estourado, mas valeu a pena, porque ninguém decepciona.

Com tudo isso em mãos, fica fácil construir uma bela história, certo? Nananinanã. Como diria o outrora filósofo MC Créu, tem que ter habilidade: juntar as várias pontas que vão se soltando pelo caminho dá um certo trabalho, e, às vezes, parece que nem assim tudo fica 100% redondo. Até agora não consegui entender muito bem como a equipe sabia exatamente no sonho de quem estava entrando, por exemplo. Mas nada que tire a engenhosidade da proposta.  

As semelhanças/referências a Matrix aparecem em vários momentos, desde os corpos adormecidos/plugados, passando pelo personagem que constrói as realidades (o arquiteto, oras!) até a incrível plasticidade de ambos os filmes. A origem tem cenas belíssimas de câmera lenta (perfeitamente justificadas pela diferença de passagem de tempo dentro dos sonhos). As sequências de luta dentro do hotel protagonizadas por Levitt são lindas demais: a ausência de gravidade transforma a pancadaria num bem coreografado balé. Mas se o primeiro tinha mais questões filosóficas e criou uma mitologia e uma estética que marcaram época, o filme de Nolan não tem essa pretensão. A viagem aqui é psicológica mesmo, individual, dentro desse grande desconhecido que é a mente humana. Quando é que precisamos de um "chute" para acordar pra realidade?


As cenas de ação não deixam a desejar: explosões, perseguições, tiros, tudo que os americanos adoram está lá, na medida certa. Mas não se deixe enganar: a história também tem muito, muito drama. Cobb é um homem angustiado, em conflito consigo mesmo, principalmente por não conseguir se livrar por completo de certos fantasmas do passado e de um enorme sentimento de culpa que carrega dentro de si. À medida que a trama vai avançando, vamos descobrindo que as coisas são mais complicadas do que aparentam ser à primeira vista. E DiCaprio, como de costume, segura bem essa onda. Só me incomoda um pouco por seu personagem ser bastante parecido, neste aspecto, com seu trabalho anterior, A ilha do medo. Por querer ser sempre tão intenso em seus papéis, talvez ele corra o risco de se repetir, mas é o preço que se paga por querer construir uma carreira longe do estigma de galã. Isso ele já conseguiu.

Mal, a personagem de Marion Cotillard, é a única que chega a ser irritante em alguns momentos, mas, no fim, descobrimos que até isso é questionável diante de outra pegadinha do roteiro com a gente. E o final que deixa uma pontinha de dúvida no ar é só a cereja do bolo. Ok, Nolan, já estou aguardando ansiosamente o novo Batman.

***

Coincidência ou não, no mesmo dia que vi A origem, assisti também a uma reportagem de turismo na Argentina e ao epílogo de Lost que vazou na internet. Resultado: sonhei que estava em Buenos Aires com Ben Linus de uniforme Dharma e DiCaprio em plena fuga. Justo eu, que raramente me lembro dos meus sonhos. Será que o filme implantou uma ideia em mim, hein, hein??? :)
Giselle de Almeida

3 comentários:

Fabiane Bastos disse...

Adoro quando misturo as coisas q assisti, ou l,i em um só sonho! Muito melhor que os sonhos que tenho tido ultimamente, só trabalho e stress :P

Filósofo? McCréu, é? Isso que é insônia produtiva! Me deixou com vontade de descobrir A Origem!

Giselle de Almeida disse...

Eu adorei, Fabi. E olha que eu tive que escolher entre esse e Meu malvado favorito, que estou doida de vontade de ver. É o próximo da minha lista!

Fabiane Bastos disse...

Nós e nossas listas! Onde vamos parar com isso???? kkkk

Momento jabá! Ei leitores da Gi, olha outra das listas dela
http://dvdsofaepipoca.blogspot.com/2010/01/em-2009-durante-o-festival-do-rio-duas.html