Pretérito mais que (im)perfeito



Nunca levei muita fé nessas pessoas que dizem que não fariam nada diferente se pudessem voltar no tempo. No mínimo, são pessoas sem imaginação, porque o que a vida mais oferece são possibilidades. E, sinceramente, acho uma existência só muito pouco para dar conta disso tudo.  E é por isso que o argumento de O homem do futuro sempre terá seu charme. Porque, hoje, você pensa que poderia ter feito diferente por conta de todas as suas experiências acumuladas (ou mesmo pelas suas frustrações), mas, se tivesse feito outras escolhas, talvez pensasse de outra forma. Porque a vida sempre será esse enigmático e insolúvel paradoxo.

Depois de anos de dedicação ao seu projeto, o cientista Zero (Wagner Moura) tem a oportunidade única de consertar as coisas. Em 1991, Helena (Alinne Moraes), seu grande amor, partiu seu coração ao humilhá-lo publicamente, numa brincadeira cruel à la Carrie, a estranha, diante de todos os alunos da faculdade. Numa tacada só, ele seria capaz de evitar essa perda e manter sua reputação intacta, uma oportunidade de ouro. Só depois ele entende que essa matemática não era, assim, tão exata. E que tentar enganar o destino tem consequências que nem Einstein poderia prever.


O tema da viagem no tempo não é nenhuma novidade, é verdade, e o filme recorre a algumas frases de efeito previsíveis e se apoia em várias situações já vistas à exaustão no cinema americano. Mas é impossível não embarcar nessa fantasia que brinca de ser ficção científica, com um quê de De volta para o futuro (quem não lembrou de Marty McFly fugindo de si mesmo durante o baile e do almanaque de jogos de Biff Tannen?). Recheado de deliciosos momentos cômicos, o longa também tem ótimas cenas dramáticas com os protagonistas e é devidamente amparado por coadjuvantes escolhidos a dedo, como Maria Luísa Mendonça, Fernando Ceylão e Gabriel Braga Nunes (que merecia bem mais espaço). E se não houve tanto cuidado na caracterização dos personagens, que praticamente não envelheceram em 20 anos, a nostálgica trilha sonora, que inclui Legião Urbana, Radiohead e INXS, entre outros, compensa uma ou outra derrapada.

Claudio Torres é um roteirista competente e um diretor habilidoso, além de ser um realizador corajoso e de visão. Corajoso por investir com elegância e talento na comédia, esse gênero tão menosprezado pelos pseudointelectuais e tão maltratado por produtores que gostam de ofender a inteligência do espectador com neochanchadas. Além disso, seus dois trabalhos mais recentes têm como protagonistas Wagner Moura e Selton Mello (A mulher invisível), não só conhecidos rostos da TV (que servem como chamariz de público) como dois dos mais talentosos atores de sua geração, completamente estabelecidos no cinema (que garantem a esse público duas horas de excelentes atuações). Não há nenhum problema em elencos globais nos filmes nacionais, desde que isso não signifique que eu pague ingresso para ver um telefilme de baixa qualidade. O cinema brasileiro precisa criar mercado sim, isso não é pecado, assim como precisa manter as produções independentes, autorais, experimentais, de baixo orçamento. Mas com coisa boa, faz favor. Nosso bom gosto agradece.
Giselle de Almeida

3 comentários:

Fabiane Bastos disse...

Adorei o homem do futuro. É o melhor filme nacional do ano, sem dúvida!

Giselle de Almeida disse...

Você pode falar com propriedade, né, Fabi? Já viu todas as estreias nacionais recentes! Eu tô em dívida :(

Fabiane Bastos disse...

Dispensava a maioria. Vc viu a q vale a pena, é o q importa!